7 de mai. de 2008

/NOTÍCIA/ Competitividade na cabeça

Solução para empresas se manterem à frente passa pelo repertório de conhecimento de pessoas bem preparadas

Paulo Jebaili

Mas o que aconteceu no mundo para que a educação corporativa se tornasse item de primeira necessidade? Ainda que ventilado anteriormente, o conceito de educação corporativa ganhou impulso na década de 90, na esteira da globalização. As mudanças ocorridas nas esferas das relações comerciais e da tecnologia determinaram novos padrões de competitividade. Isso fez com que evaporasse qualquer noção de controle por parte das organizações.

"Na realidade anterior, um projeto de um automóvel, por exemplo, durava décadas, com pequenas mudanças ao longo desse período. Quanto tempo durou o Opala?", observa o consultor José Emídio Teixeira, da Dialogar. "Hoje, o tempo de vida útil de um automóvel deixou de ser contado em décadas e passou a ser contado em anos. Depois de 4 ou 5 anos, o público já está querendo outra coisa."

Nesse contexto, todo mundo teve de se mexer e a capacidade de apresentar respostas rápidas passou a ser vital para se manter no ringue da competitividade. A preparação passou a se dar por meio de pessoas bem preparadas, mobilizando o que têm de melhor em busca de soluções e novas idéias. "Os recursos físicos, materiais, tecnológicos hoje são acessíveis para praticamente qualquer empresa. O que passou a diferenciar as empresas, o elemento de competição foi o conhecimento e a gestão desse conhecimento", explica a professora e gestora da Universidade Anhembi Morumbi, Cristiane Alperstedt.

Os níveis acirrados de disputa pelo mercado exigiram novas formas de relacionamento com o cliente.
"O que eu produzo a fábrica do lado produz igualzinho", exemplifica a consultora Maria Inês Costa, da CB Center. "O sucesso é quando tenho novas idéias, soluções, enquanto o outro entrega commodities. É a lei da diferenciação das empresas. E a diferenciação está nas pessoas. Então, é preciso introduzir uma forma de vincular as pessoas ao cliente, ao negócio, ao mercado."

Na visão da consultora, essa demanda marca a passagem para a sociedade pós-industrial. "Era muito fácil avaliar as pessoas quando tinham de entregar uma coisa pronta, na sociedade industrial", comenta. "Na pós-industrial, analisar o comportamento das pessoas, remunerar, valorizar é muito mais difícil porque é um monte de gente tendo idéias e servindo o cliente cada vez de maneiras diferentes", compara.

Os níveis de competitividade passaram a ser muito mais determinados por sinapses do que por engrenagens. "A empresa não quer mais aqueles seres não-pensantes de antigamente, com auxiliares fazendo coisas operacionais, sem valor agregado. Hoje, o computador faz isso. É preciso ter pessoas bem preparadas para fazer análises, atendimento, saber lidar com a informação", observa Fábio Mandarano, gerente sênior da área de consultoria em Gestão de Capital Humano da Deloitte.

Se gente é importante, gente que cuida de gente, então, ganha status de VIP. Com a incumbência de buscar bons profissionais e criar as condições necessárias para que apresentem os resultados desejados, a área de recursos humanos chega a outro patamar. "RH passou a se alinhar com as outras áreas. Na medida em que fica definido que as pessoas são importantes e precisam ser cuidadas, decididamente a pessoa, a equipe ou a área responsável por elas ganhou força", constata Emídio.

O próprio profissional de RH teve de elevar seu nível de capacitação, sobretudo, para entender de negócio. E, no mínimo, para não vestir a carapuça do famigerado Paschoal, do departamento pessoal, citação freqüente em tom de galhofa nas palestras do meio. "O RH passou a olhar para sua participação na empresa não como alguém que está de fora e ajuda, mas alguém que está focado no negocio", diz Emídio. "O gestor de RH tem de olhar para esse fenômeno do seu trabalho como estratégico. E se questionar: 'De onde vou tirar as pessoas com a competência necessária para manter essa empresa na frente?'".

Longevidade

Competência passa a ser palavra-chave quando se fala da capacidade de profissionais e empresas se movimentarem num ambiente de tal complexidade. A definição mais corriqueira de competência é a soma de "conhecimento, habilidades e atitudes", atributos cujas iniciais formam a sigla CHA. Mais do que uma infusão, espera-se que as doses desse "chá", se corretamente administradas, funcionem como um elixir de longevidade.

O rito de passagem de RH para o rol das funções estratégicas, em muitos casos, não se deu sem momentos de dureza. "As áreas de RH tiveram de se envolver em projetos de downsizing, de reestruturação produtiva, coisas que pegam pelo outro lado, o de diminuir o denominador da empresa", relembra Emídio. "Muitas pessoas habituadas a trazer pessoas para a organização tiveram de encontrar uma forma correta de colocá-las de volta no mercado." É nessa época que o conceito de empregabilidade se torna um marco para quem quer manter-se desejável pelo mercado de trabalho. No que concerne à carreira, o diploma até então sinalizava estabilidade até a aposentadoria. Hoje é tão-somente uma pedra fundamental, a partir da qual se ergue uma obra para sempre inacabada. No âmbito das empresas, o que se resolvia com ações pontuais, para suprir deficiências, agora requer investimento permanente em capacitação. A noção de educação corporativa se difunde.

"As empresas descobriram que não era mais suficiente só o treinamento e desenvolvimento de seu pessoal. Os programas comuns no departamento de T&D eram meio reativos. Verificava-se uma necessidade e implementava-se um programa", conta Cristiane. "Percebeu-se a necessidade de se antecipar a esse tipo de coisa. Trazer o conhecimento para a empresa e desenvolvê-lo antes mesmo de ele ser necessário. Adquiriu-se um comportamento proativo", analisa.

Como desdobramento, as universidades corporativas proliferaram, numa demonstração de que as empresas estavam dispostas a tratar a educação de uma forma mais sistêmica, seja na realização de treinamentos (que continuam necessários), na elaboração de programas para atender às necessidades específicas ou na costura de parcerias com as instituições de ensino. "Os treinamentos nos últimos anos vêm sendo trabalhados no conceito de universidade corporativa, olhando a educação das pessoas da empresa não só em termos de treinamento operacional, mas preparando a cultura das pessoas, alinhando os valores, as crenças delas aos da empresa; são também treinamentos comportamentais, treinamentos de liderança", observa Mandarano, da Deloitte.

Pessoas aprendem, empresas, idem. E todos estão tendo de aprender a aprender, inclusive.


Capacitação em alta

Investir no desenvolvimento de pessoas é o primeiro item da pauta dos profissionais de RH. É o que mostra a pesquisa "Tendências em Recursos Humanos", da Deloitte, realizada em 2006 com 140 empresas de São Paulo, Rio de Janeiro e Região Sul. Quando perguntadas quais as áreas que terão crescimento no orçamento nos próximos dois anos, treinamento e desenvolvimento aparecem com a maior ocorrência (80%), seguidos de TI (33%) e comunicação interna (28%). Entre os pontos em que RH concentrava os maiores esforços, a opção "melhorar a capacitação da mão-de-obra com treinamento e desenvolvimento" aparece em segundo lugar com 51% das ocorrências, atrás de "ajudar a empresa e/ou outras áreas nos processos de mudança organizacional" com 56%.

Os maiores esforços da área de Recursos Humanos atualmente estão concentrados em:

Ajudar a empresa e/ou outras áreas nos processos de mudança organizacional 56%
Melhorar a capacitação da mão-de-obra com treinamento e desenvolvimento 51%
Implantar um novo modelo ou rever o atual sistema de remuneração 44%
Revisar e/ou melhorar o atual modelo de gestão de pessoas da empresa 41%
Implantar e/ou desenvolver soluções de TI aplicadas a RH 31%
Aprimorar os sistemas de comunicação na organização 26%
Implantar sistemas de Gestão de RH por habilidades e competências 23%
Implantar e/ou aprimorar programas de qualidade de vida 13%
Melhorar os sistemas relacionados a DP 13%
Reorganizar e/ou reestruturar a área de RH 13%

Fonte: Tendências de RH, Deloitte

As áreas de Recursos Humanos que terão aumento no orçamento nos próximos 2 anos:

Treinamento e Desenvolvimento 80%
Tecnologia da Informação 33%
Comunicação Interna 28%
Medicina do Trabalho, Segurança do Trabalho e Saúde Ocupacional 28%
Remuneração 28%
Benefícios 10%
Recrutamento e Seleção 10%
Departamento Pessoal 5%

Fonte: Tendências de RH, Deloitte


Como surgiu o conceito de gestão de conhecimento?

O conceito de gestão de conhecimento começou a ser construído por Chris Argyris, que publicou "Organizational Learning", em 1978, em parceria com Donald Schon. Outras obras subseqüentes do autor trataram do mesmo assunto. Mas foi Peter Senge quem difundiu o tema de aprendizagem organizacional na década de 1990, quando publicou "A Quinta Disciplina". A aprendizagem organizacional evidenciou que as empresas aprendem, ao possibilitar a interação entre competências individuais, organizacionais e estratégias da empresa e, sobretudo, que acumulam esse aprendizado. Foram Nonaka e Takeuchi, em 1995, que exploraram a gestão do conhecimento como tentativa de tornar explícito o conhecimento acumulado. Esse é o conceito que eu adoto.

Profª Cristiane Alperstedt, Universidade Anhembi Morumbi


Fonte: Revista Ensino Superior - UOL

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